terça-feira, junho 17, 2008

Toró de Parpite nr. 13. Gratidão à Suiça.




Birmensdorf, 28.05.2001 Primavera. Calor. Sol. nr. 13


Olá pessoal,

Em novembro do ano passado estive na Embaixada da Suíça, em Brasília, para retirar o visto de estudante. Quando atravessei os portões da Embaixada e pisei em solo suíço (ainda que no Brasil), meu coração entrou em clima de batucada, algo comparável ao que sinto quando uma câmera liga e o cinegrafista diz “valendo“.

Foi muito emocionante...

Fiquei olhando a bandeira vermelha e branca em contraste com o céu cinza (o céu estava cinza em Brasília, só pra combinar com o tempo nos Alpes) e me perguntando que emoção era aquela. Na época, acreditava que iria dividir as emoções e aflições com um suíço - o que me levou a pensar que aquele sentimento tão bom e forte alí, no pátio da Embaixada, viesse dessa certeza de que tinha encontrado um amor.

Hoje, com o lago da mente mais calmo e os contornos das emoções mais definidos, percebo que aquela emoção sentida em Brasília não teve raíz no amor que senti por um suíço mas, no amor que senti e sinto por esta Pátria.

Foi aqui neste país, sob um céu cinza e um clima gelado que iniciei a mais bela viagem da minha vida: a viagem interior.

O que sinto pela Suíça é a mais pura gratidão por ter me acolhido com os braços abertos e por ter me proporcionado a descoberta de tantas belezas.

Aqui com nesta nação que aprendi a lição de que disciplina nada tem a ver com autoritarismo e espontaneadade nada tem a ver com irresponsabilidade.

Foi aqui também que comecei a prestar atenção nas minhas palavras e em como as desperdiçamos com o medo, a superficialidade e a intolerância.

Na Suíça as resoluções amadurecem devagar e as realizações exigem muito tempo. Existe um projeto de um túnel que está em discussão há 12 anos!!!!! Nada é feito „nas coxas“, pra ver no que dá...

Esse cuidado com o planejamento, com os detalhes, me levou a entender e a exercitar um cuidado pela minha vida. Foi aqui que comecei a me perguntar profundamente: „o que estarei fazendo daqui a 10 anos? O que faço agora está me levando para onde quero estar daqui a 10 anos? E, principalmente, o que tenho agora é o suficiente? Vale a pena investir meu tempo e sentimento neste projeto ou pessoa?“

Devo este despertar a Suíça, país que me proporcionou condições para a minha consciência se expandisse e assumisse uma postura mais madura perante mim mesma, meus desejos e perante os outros.

A Suíça está entre os cinco países mais ricos do mundo. E esta riqueza pode ser vivenciada por todos. O transporte público é exemplar. Até quem está aqui ilegal, trabalhando como babá ou faxineira, goza de uma qualidade vida que deixaria a nossa classe média com água na boca. Essa coisa do trem sair pontualmente no horario previsto (às 7h39) ainda me deixa perplexa. Como pode um país ser tão organizado? A Suíça me prova a todo instante que um mundo com menos desigualdades é possível.

É fato que por trás desta riqueza toda tem a receptação do ouro judeu, dinheiro nazista e dos lucros de todo o tipo de porcaria praticada no mundo: desde narcotráfico à corrupção, passando pela fuga de capital estrangeiro.

Tempos atrás, quando o tema corrupção no Brasil era o predileto nas rodinhas das festas que frequentava, um banqueiro parecia deliciado em expôr as feridas do nosso país. No meio do discurso irônico, interrompi-o e disse-lhe que „um país que recebia o dinheiro roubado do povo através da corrupção não podia ser considerado melhor do que o nosso. E o senhor, sendo banqueiro, deve saber melhor do que eu sobre este assunto.“ Depois disso, nos encontramos várias vezes em outras festas mas, ele nunca mais pôs as garrinhas de fora.

Mas nem só de sacanagem é construída a qualidade de vida aqui. Os suíços também pagam pelos serviços que recebem - e caro! Os impostos são altos, certeiros e não tem essa de não pagar, não. Eles conseguiram desenvolver um sistema tão transparente que fica difícil passar a perna. E nem pense que não existe suíço que tenta dar o cano no imposto. Eles existem sim, mas como o sistema funciona bem, fica mais difícil conseguir.

Não existe essa de povo mais ético, ou mais consciente. No fundo, todo mundo quer o mesmo: samba, suor e cerveja. Coloque um suíço safado num país com leis menos rígidas e você vai ver a „ética“ que ele tinha na Suiça onde vai parar...
De qualquer forma, foi aqui na Suiça que as palavras cidadania e igualdade social sairam do papel e fizeram sentido para mim. Foi aqui tambem que fiz a minha viagem interior. Por isso, nao tenho outro sentimento que nao seja gratidão pela Suiça.


MÚSICA DA VEZ - Guilherme Arantes

Eu quero o sol ao desperta
Brincando com a brisa
Por entre as plantas da varanda em nossa casa
Eu quero amar
É lógico que o mundo não me odeia
Hoje eu sou mais romântico
Que a lua cheia
Você mostrou pra mim
Onde encontrar assim
Mais de um milhão de motivos pra sonhar
E é tão gostoso ter os pés no chão e ver
Que o melhor da vida
Vai começar

Beijos e até a proxima!
* Patricia Nascimento Delorme, 36, jornalista e mãe do Luka, saudosista que nunca esqueceu a Suiça e é de la que ela vos escreve, apesar de viver fisicamente na Guiana Francesa. Seu e-mail: patienascimento@hotmail.com

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